13 de ago. de 2011

E eu que aprendi na faculdade de veterinária que trabalharia APENAS com os animais ....


MÉDICO DA FAMÍLIA - TRAZIDOS PARA DENTRO DE CASA E CRIADOS COMO FILHOS, CÃES E GATOS TÊM CADA VEZ MAIS INFLUÊNCIA EM NOSSA SAÚDE
Simone e Homero queriam engravidar. Tentaram por três anos. Nada. Exaustos e frustados, decidiram adotar um cachorro. A escolhida foi Nina, uma pequena maltês branca de dois meses.
A chegada de nina trouxe ao casal alegria e descontração. Relados e sem cobranças – adivinhe?!-, eles engravidaram um mês depois.
Fazer planos para receber Gabriel se transformou, então, no principal programa familiar de Simone, Homero e, agora, Nina. Ela dormia sobre a barriga da ‘mãe’e participava das conversas com bebê. Como manda o figurino, foi vermifugada, vacinada e, chegada a hora, encaminhada à castração.
Não há dúvidas: castração é medida de saúde publica. Do ponto de vista individual, reduz a 0, 05% a chance de câncer de mana, se for realizada antes do primeiro cio. Do ponto de vista coletivo,  é a principal arma contra o abandono e as zoonoses.
A veterinária sabia disso e insistiu com Simone. Ela titubeou. Voltou à clinica uma, duas,  três vezes para tirar dúvidas. Disse que tinha medo. Mas a veterinária argumentou que os benefícios eram relevantes. Grávida de oito meses,  Simone concordou.
Dia marcado, lá estava Nina. Simone voltaria para buscá-la no final do dia, mas, bem antes da hora marcada, o telefone tocou: Nina havia morrido na anestesia. Foi como se o chão se abrisse debaixo dos pés de Simone.
Sei que os inimigos da castração podem se agarrar a esse para tentar combate-la. Não faz sentido.
Procedimentos anestésicos têm risco em qualquer espécie,  inclusive na humana. E isso precisa ser claramente dito ao dono do animal. Segundo os estudos sobre o tema, o que ocorreu com Nina se repete em 0, 89% dos cães anestesiados – índice que nunca chegará a zero porque o organismo terá sempre reações inesperadas.
Para Simone,  as estatísticas não dizem mais nada. No caso dela, a perda foi de 100%. Mas não se pode deixar que a dor,  que  embota os olhos, também embaralhe os conceitos. Não castrar um animal por conta do risco equivale a deixar de leva-lo para passear porque o sol pode causar câncer de pele. Sim,  é verdade. Mas a chance de ele ficar obeso se não sair de casa é, sem dúvida, muito maior.
Pelo laudo da necropsia, não há indicio de falha técnica na conduta da veterinária. Talvez o problema resida exatamente neste ponto: ela foi exclusivamente técnica. Se tivesse levantado os olhos do prontuário de Nina, ela teria notado Simone: uma mulher grávida, sensível, temerosa e às vezes vésperas de realizar um sonho. E, se tivesse enxergado Simone, talvez compreendesse que a castração poderia esperar alguns dias. Tudo é questão de decidir que medicina se quer fazer.
Nos próximos meses, o Ministério da Saúde vai autorizar que veterinária integrem as equipes de saúde da família. Será o reconhecimento oficial de que cães e gatos,  trazidos para dentro de casa e criados como filhos, têm influência cada vez maior sobre nossa saúde física e metal.
Para os veterinários, é um desafio: estudam por cinco anos para tratar de bicho e descobrem, na prática, que cuidam também de gente. 

Artigo por: Sílvia Corrêa
Fonte: Folha de S. Paulo
Data: 1 de Agosto de 2011

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